Pais Irresponsáveis, Filhos Marginais
O jornalista, consultor político, pai e padrinho de minha filha, Melck Aquino, publicou um artigo no site da Roberta Tum (link aqui) no qual fez ponderações fortes sobre a maneira como a sociedade como um todo e os pais, de forma específica, têm cuidado e criado seus filhos.
Eu tenho uma filha de 8 anos de idade (a afilhada do Melck) que, com o falecimento da mãe, veio morar comigo e minha esposa.
Não tenho como avaliar o tamanho da perda, a dor que aquela cabecinha infantil e aquele coraçãozinho bondoso têm sentido. Não seria só arrogância, seria mentira se eu dissesse que sei o que se passa com ela. Estou chegando aos 50 anos de idade e minha mãe ainda está viva.
Ainda assim, eu e minha esposa temos tentado, dentro de nossa melhor capacidade, suprir as necessidades de minha filha. E quando eu falo em necessidades não digo escola, comida, roupas… Isso é o obrigatório, isso é o compromisso que vem quando se tem uma criança, isso é o equivalente a trabalhar, comer e vestir para um adulto.
As necessidades reais de uma criança são os valores morais, aquele tipo de trabalho que cansa, que demora para mostrar resultados, que afasta pais e separa casais.
Vivemos uma época desregrada, que vai do bem intencionado “politicamente correto” ao absurdo desumano, dentro do mesmo sistema, da mesma casa.
Dois adultos se esfaqueiam na porta de uma escola para resolver um problema entre os filhos. Nem vale a pena mostrar a ironia que é uma coisa dessas acontecer em uma escola. Mas o que o irresponsável do pai pensa que seu filho vai aprender com isso?
“Pronto, violentamos os corpos de duas pessoas. Agora vamos fugir e depois mandamos uma carta para um jornal.”
Deus do céu!!
Não acredito que o pai, em momento algum, pensou na sequela, na consequência moral que seus atos terão no futuro de seu filho, no impacto do que foi visto e vivenciado por esse adolescente produzirá em seu caráter em formação.
Era apenas um homem descontrolado, sem preocupação com a formação do próprio filho, se entregando a um impulso de bestialidade, cada dia mais comum e aceito.
Valores simples como patriotismo ou respeito aos mais velhos são completamente esquecidos atualmente. Os exemplos negativos se acumulam e achamos cada vez mais normal a existência de políticos, juízes e policiais corruptos.
Se antigamente um filho perguntasse ao pai: “Vale a pena ser honesto?”. O pai, provavelmente, remodelaria a arcada dentária do filho. Hoje, entretanto, vemos, quase que diariamente, filhos de políticos afundando na sujeira dos próprios pais. O mal exemplo se alastra como fogo! O ganho rápido, a qualquer preço, substituiu a honestidade, o valor da palavra empenhada.
Me vem à mente uma pequena citação de Rui Barbosa. Não sei em qual contexto essas palavras foram usadas pela primeira vez, mas quase 100 anos depois, elas continuam atuais:
"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto."
Muita gente me pergunta e comenta como deve ser difícil para mim manter minha filha feliz depois de ter perdido a mãe.
Me perdoem os indolentes que acham que a televisão pode educar mais que os pais, os que preferem passar a responsabilidade da criação de seus filhos para a escola, mas, nesse momento, felicidade não é minha prioridade para minha filha.
Vejo felicidade como um bônus. Minha obrigação real é dar a ela valores humanos, respeito, consideração, empenho, ajudar na formação de um caráter correto, firme, seguro. Essa é minha obrigação e missão. Se alguma felicidade emergir daí, tanto melhor.
Em uma sociedade sem heróis, em que as novelas de televisão valorizam a traição e o sexo fácil, em que os filmes e jogos estimulam a violência e agressividade, em que as próprias escolas corroboram o tratamento permissivo, abonando os erros e olhando para o outro lado enquanto essa geração se desvia, minha preocupação está muito mais no futuro que no presente!
E que os pais não se enganem. Qualquer coisa, qualquer coisa mesmo, que dê errado na formação do caráter de seu filho será responsabilidade SUA! Não terão sido as más companhias, o professor desinteressado, o tio mal exemplo. Terá sido sua falta de atenção, sua falta de pulso, sua negligência.
Se daqui a 15 anos minha filha, após terminar seu primeiro curso superior, vier reclamar comigo que sua infância não foi tão divertida quanto ela desejava, eu vou me considerar vitorioso. Afinal, ela terá aprendido o valor do estudo, do diálogo, mas principalmente, terá sobrevivido!!
Em tempos em que crianças têm as mãos decepadas e vidas tolhidas por criminosos impunes, sobreviver é um grande feito!
E será um grande feito de nossa geração, principalmente porque teremos conseguido ultrapassar os erros da geração anterior, que permitiu que descêssemos a esse nível de barbárie. Culpar a sociedade não é mais suficiente. Esse problema está batendo em nossas portas e, pior, em nossos filhos.
É hora de aceitarmos o fato de que, pela falta de ação e excesso de proteção, permitimos que a situação chegasse a esse ponto e começar a nos planejar para resolver o problema. Porque na real acepção do problema, isso não é uma situação social (embora se arraste para ela e a arraste para o buraco). Essa situação é individual e somos nós, indivíduos, que temos a obrigação de corrigi-la. E, nesse processo, criar um sistema seguro e compatível com o que queremos para nossos filhos, lembrando que a continuidade de nossa sociedade é reponsabilidade de cada um de nós.
P.S. “Marginal” do latim marginalis; que está à margem, ou quem vive à margem da sociedade.
Embora o termo seja confundido com as palavras “criminoso” e “bandido”, o marginal pode apenas não ter encontrado seu eixo, sua localização social. Que nós, pais, entendamos a diferença e nos apressemos para tirar nossos filhos da marginalidade, antes que a bandidagem os leve.
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