Les Sept Jours du Talion

aff_7joursTalion Cartaz original do filme

Sempre reclamo dos pseudo-profissionais que fazem as traduções dos títulos de filmes no Brasil. Aqui não vai ser diferente.
O título, se traduzido corretamente, seria “Os Sete Dias de Talião”. No Brasil ficou “Sete Dias”. Sei que faz pouca diferença, mas o pessoa que faz a tradução imagina que quem lê não vai entender o que a palavra “talião” quer dizer ou ele mesmo não sabe e prefere omitir. Um ignorante fazendo um trabalho culto.

Talião é um substantivo e quer dizer “retaliação”, “pena idêntica à ofensa praticada”. É uma das regras do Código de Hamurabi e tem sua mais conhecida representação na frase “Olho por olho, dente por dente”.

Atenção!
Spoiler Alert!!

Algumas partes deste post podem conter informações que revelem partes da trama do filme!!

Recomendo que se não tiver assistido ainda, não leia daqui para baixo!!

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Les-7-jours-du-talion-Movie-Poster Cartaz comercial do filme

O filme, do diretor canadense Daniel Grou, conta a história de um pai (Claude Legault) que tem a filha de 8 anos seqüestrada, estuprada e morta. O pai, então, planeja seqüestrar o homem acusado do crime e torturá-lo por 7 dias. Após esse prazo, ele mataria o estuprador e se entregaria à polícia.

Seria um roteiro banal, não fossem os caminhos tortuosos que o diretor pega para narrar os acontecimentos.

Há o processo de identificação, quando nos apaixonamos pela criança, filha amorosa, aluna inteligente, linda e delicada. É chocante o contraste da visão da menina de lacinho cor-de-rosa nos cabelos, sorrindo ao caminhar em direção à escola, com a mesma menina morta encontrada pelo pai, ferida, pálida, machucada, com o lacinho que horas antes o pai colocara em seus cabelos, agora amarrando as mãos ensanguentadas e imóveis.

O diretor evita a violência explícita, nunca é mostrado o momento da morte da criança, mas a câmera captura detalhes que, para mim, foram ainda mais terríveis, como a calcinha rasgada enrolada em um dos pés da menina.

Depois disso, temos a culpa compartilhada pelos pais e os indícios claros que o casamento não sobreviverá ao trauma da perda. Quando um suspeito é preso, o pai, um médico canadense rico, começa a preparar sua vingança.

E é a partir daí que o filme se torna único. Aquela atitude que eu, como pai, poderia entender como razoável, pela dor que um pai sentiria, pelo roubo do futuro de uma criança, aquela atitude de vingança, se torna tão terrível para o pai quanto a dor que ele experimentou antes, com a morte da própria filha.

O pai, em momento algum, fala com sua vítima. A única voz que temos é a do acusado pelo crime. Porém, a intenção do pai em não conversar com sua vítima, tentando evitar qualquer tipo de consideração humana, cai por terra à medida que a sua vítima fala com ele ou para si mesmo.

Em alguns momentos, fica claro que o pai agora é o monstro que ele mesmo combate e ele responsabiliza o estuprador pela sua própria transformação!

O pai deixa um bilhete para a polícia, informando que torturaria o “assassino de sua filha” por sete dias, depois o mataria e, então, se entregaria à justiça. A mídia, tomando conhecimento desse bilhete, passa a explorar a situação. E o tema se prolonga à medida que a polícia não consegue encontrar o pai. Acompanhando as notícias na TV, o pai fortalece sua intenção com os comentários em sua defesa e se abala com as pessoas que se opõem a ele.

Um alce morto, do lado de fora da casa à beira de um lago que o pai escolheu como local para aplicar a punição em sua vítima, faz com que ele confronte a degradação a que ele mesmo se entrega.

Quanto mais o tempo passa e mais intenso fica o processo de tortura, quanto mais fundo o pai se enterra e há momentos em que o castigo dele é maior que o de sua vítima.

Numa espiral descendente, o pai começa a se revoltar contra as pessoas que, na televisão, contestam sua justa vingança. Sua tentativa de mostrar sua compreensão dos fatos para quem é contra sua ação se torna ainda mais terrível – quando ele traz para pessoas inocentes um sofrimento antigo já superado pelo tempo e que, por sua atitude, agora é revivido -- e é cada vez mais difícil para o espectador determinar o “certo” e o “errado”. Ao final, o pai se encontra preso em um sistema que ele não mais respeita ou acredita e que não permite sua saída, porque é necessário justificar suas ações. Inclusive perante a filha morta.

Um homem perdido entre culpa, remorso e ódio, destruindo a si mesmo e as melhores qualidades que uma pessoa pode ter em nome de uma justiça que ele não conhece e que não lhe trás conforto. Ele é um homem que teve o amor arrancado de dentro de si violentamente e é com violência que ele tenta preencher o vazio.

A fotografia do filme usa a câmera quase que como um personagem ou uma emoção comum aos personagens. Indo da imagem firme, precisa e sólida de uma câmera sem movimentos que mostra o pai operando um paciente, passando pela câmera escondida atrás de uma parede, vendo pela fresta da porta o choro convulsivo da mãe que perdeu a filha, até a câmera descontrolada, tremida e imprecisa, que nos mostra a degradação física e emocional à qual o pai se entrega, em uma vingança que mais parece auto-punição.

_”Doutor, você acha que a vingança é a melhor solução?”

_”Não.”

_”O senhor se arrepende do que fez?”

_”Não.”

7jdutalion_dvdz2 Cartaz publicitário e capa do DVD do filme

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